Extrema direita vence eleição na Holanda e amplia avanço de radicais na Europa
Partido pela Liberdade defende saída do país da União Europeia e denuncia ‘invasão islâmica’ no Ocidente
A Holanda passou por uma reviravolta política surpreendente, nesta quarta-feira, quando o Partido pela Liberdade (PVV), sigla de extrema direita que fez campanha massiva utilizando a bandeira anti-imigração, foi o mais votado nas eleições legislativas nacionais, segundo pesquisas boca de urna divulgadas logo após o fim do pleito. A vitória do partido acende um alerta na União Europeia (UE), que ainda aguarda a formação de governo para medir os impactos da votação para além das fronteiras de um de seus principais integrantes.
O Partido pela Liberdade, liderado pelo político Geert Wilders, é conhecido por posições anti-Islã e anti-UE. De acordo com as projeções iniciais, a sigla deve conquistar entre 35 e 37 cadeiras no Parlamento, o maior bloco conquistado por um único partido no pleito, a frente da aliança de esquerda e do bloco de centro-direita VVD, que devem ter 25 e 24 assentos, respectivamente, segundo levantamento da IPSOS.
— O eleitor holandês falou — disse Wilders, em um discurso na noite de quarta-feira, reivindicando a vitória. — Os holandeses esperam que o povo possa recuperar seu país e que possamos garantir que o tsunami de solicitantes de asilo e imigração se reduza.
Se os resultados preliminares se mantiverem, a Holanda estará no limiar de um terreno político incerto, após 13 anos de gestão do primeiro-ministro Mark Rutte, um fiel da política holandesa e líder confiável dentro da União Europeia. Embora tenha ajudado a construir um lugar de destaque para o país no bloco, ao promover uma agenda econômica baseada no livre comércio e em regras comuns, Rutte não conseguiu evitar o colapso de seu Gabinete após fracassar em apresentar uma política migratória que pacificasse o país.
Em julho, o líder holandês anunciou que se afastaria permanentemente da vida política. Ele permanece no cargo apenas até a formação do novo governo.
Vitória nas urnas, governo em aberto
Ao comemorar o resultado conquistado nas urnas, Wilders afirmou que seu partido “não pode ser mais ignorado”, e convocou as demais legendas a se abrirem para negociar a formação de um Gabinete liderado pelo PVV. O cenário, contudo, não é dos mais simples.
Líderes dos três principais partidos do país declararam que não formariam parte de uma coalizão com o PVV. Apenas o Novo Contrato Social, sigla que deve obter 20 assentos segundo a pesquisa de boca de urna, sinalizou estar “disponível”, mas seu líder, Pieter Omtzigt, antecipou que a negociação “não será fácil”.
Para a formação do último governo, foi necessário o recorde de 271 dias. E, por enquanto, a incerteza é total.
Anti-UE e anti-imigração
Geert Wilders faz parte do cenário político holandês há décadas, e construiu sua carreira sobre uma cruzada contra o que ele chama de “invasão islâmica” no Ocidente. Seus desentendimentos com a justiça, que o considerou culpado de insultar os marroquinos (a quem chamou de “escória”), e as ameaças de morte, que o fazem estar sob proteção policial desde 2004, não o desanimaram.
O líder radical já propôs a detenção e deportação de imigrantes ilegais e a devolução de solicitantes de asilo da Síria. Ele também se disse favorável a taxar as diferentes vestimentas muçulmanas para cobrir a cabeça e à proibição do Alcorão.
Embora a eleição, incluindo as críticas de seus rivais, tenha sido marcada por um debate forte relacionado ao tema da imigração, o candidato tentou suavizar sua imagem para agradar uma parcela maior do eleitorado, na linha de que o país teria problemas mais urgentes do que os solicitantes de asilo. Após votar em Haia, ele disse à imprensa que seria primeiro-ministro “para todos”.
Cenário europeu
O Partido pela Liberdade segue uma linha de política externa de “Holanda em primeiro lugar”, e tem um viés negativo quanto à integração europeia. Um dos pontos do programa da legenda é um referendo sobre o “Nexit”, a saída da Holanda da UE. Também consta um “cessar-imediato” da ajuda ao desenvolvimento. Apesar disso, Simon Otjes, professor assistente de política holandesa na Universidade de Leiden, disse que o tema não teve lugar de destaque na campanha. Para ele, é improvável um avanço neste sentido, pela falta de apoio à medida no Parlamento.
— A Holanda será mais dura e mais conservadora na Europa, inclusive em matéria de orçamentos e migração — disse, em entrevista ao New York Times.
Por outro lado, a vitória de Wilders prolonga uma série de avanços de partidos de extrema direita no norte da Europa, incluindo a Suécia, onde o governo agora depende dos votos parlamentares de um partido com raízes neonazistas, e a Finlândia, onde a direita ascendeu.
Pouco depois do resultado da boca de urna ser anunciado, o primeiro-ministro nacionalista húngaro, Viktor Orbán, símbolo do que os analistas chamam de “democracia iliberal” comemorou os “ventos de mudança” na Holanda. No tabuleiro europeu, Bruxelas é, até o momento, um dos principais contestadores de Orbán.
O Globo(Com AFP e NYT)
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